01 Mar
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Direito do trabalho

01/03/2017

por Marçal Garay Bresciani

 

O Direito Internacional Privado, no sentido de estabelecer qual a legislação aplicável às relações jurídicas que comportem obrigações, orienta-se por dois brocardos: jus loci contractus, no qual, por princípio, é aplicável a lei do local da contratação da obrigação; e lex loci executionis contractus, em que a lei a ser aplicada nas relações de trabalho é aquela do local onde ocorra a prestação do serviço, independente do local da respectiva contratação.

No que diz respeito às obrigações de caráter trabalhista, o Brasil vem adotando o segundo posicionamento, que inclusive foi objeto de Enunciado de Jurisprudência nº 207 do Superior Tribunal do Trabalho, onde resta estabelecido que “A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação do serviço e não por aquelas do local da contratação.”. No plano dos tratados internacionais, mais precisamente no que se refere àqueles celebrados em nível interamericano, tal entendimento foi consubstanciado no chamado Código de Bustamante, datado de 1928, o qual regula de maneira geral as relações jurídicas internacionais de direito privado. No art. 198 do referido Código, existe determinação expressa de que é territorial a legislação sobre acidentes do trabalho e proteção social do trabalhador.

Como o Brasil ratificou o Código de Bustamante, por intermédio do decreto 18.671 de 1929, e uma vez que a jurisprudência da mais alta Corte Trabalhista é majoritária no sentido de aplicar às relações de trabalho em geral a legislação do local da prestação do serviço, é mais do que óbvio o posicionamento brasileiro nesse sentido, ainda que o Código de Bustamante tenha aplicação restrita aos países das Américas.

Porém, há casos em que mesmo o trabalho sendo prestado em país estrangeiro, a lei brasileira poderá incidir sobre a relação laboral. É o caso dos empregados em empresas de engenharia contratados ou transferidos para laborar no exterior, os quais estão sujeitos ao que dispõe a Lei nº 7.064 de 06/12/1982. Trata-se aqui, em verdade, de hipótese específica, pois mencionada lei diz respeito somente à atividade dos trabalhadores contratados por empresas prestadoras de serviços de engenharia.

Entretanto, invariavelmente surgem dúvidas sobre o tema, tanto da parte do empregador nacional como do empregador estrangeiro, pois a existência de uma lei que especificamente regula o trabalho dos empregados em empresas de engenharia, no exterior, tem feito com que eventualmente as demais relações de trabalho também sejam atingidas pelos efeitos da Lei 7.064/82, o que se configura em verdadeiro equívoco.

Ocorre que a Lei 7.064/82 somente poderá ter aplicação nos casos expressamente determinados em seu texto, ou seja, apenas aos empregados contratados ou transferidos para prestar serviço no exterior à empresa de engenharia. Nos demais casos, opera-se a regra geral contida no princípio da lex loci executionis contractus, cujo entendimento já encontra-se pacificado pelo Egrégio Tribunal Superior do Trabalho, em face de não haver no Brasil outras legislações especiais até o presente momento.

Portanto, em se tratando de trabalho no exterior, a lei brasileira somente poderá ser aplicada no caso específico das empresas que prestam serviço de engenharia e, quanto aos demais casos, será aplicada a regra geral de Direito Internacional Privado (legislação do local da prestação do serviço).

Dito isto, as exigências legais para a contratação do trabalhador brasileiro por empresa estrangeira podem variar, conforme o dispositivo legal aplicável. Nas relações de trabalho envolvendo empresas de engenharia, a contratação por pessoa jurídica estrangeira está condicionada à prévia autorização do Ministério do Trabalho, a qual somente poderá ser concedida à empresa de cujo capital participe, em pelo menos 5% (cinco por cento), pessoa jurídica domiciliada no Brasil. Nessa hipótese, a responsabilidade da empresa aqui domiciliada e que participe do capital da empresa estrangeira é de natureza trabalhista solidária, conforme expressamente determina o art. 19 da Lei 7.064/82, podendo ser demandada em juízo a fim de responder pelas obrigações não cumpridas por sua parceira.

A lei 7.064/82 impõe ainda outros deveres à empresa contratante, tais como: pagamento das despesas de viagem de ida e volta do trabalhador, inclusive dos dependentes que com ele residam; a permanência do trabalhador não poderá ser superior a 03 (três) anos, salvo quando for assegurado a ele e a seus dependentes o direito de gozar férias anuais no Brasil, com despesas de viagem pagas pela empresa; a empregadora deverá assegurar o retorno definitivo do trabalhador ao Brasil, no caso de rescisão contratual ou quando houver terminado o prazo de duração do contrato, bem como por motivo de saúde do trabalhador, comprovado por laudo médico oficial; a empresa deverá manter no Brasil procurador bastante, com poderes especiais de representação, inclusive o de receber citação; a empresa deverá também fazer seguro de vida e acidentes pessoais a favor do trabalhador, cujo valor não poderá ser menor do que 12 (doze) vezes a respectiva remuneração mensal; a empresa garantirá ao empregado serviços gratuitos e adequados de assistência médica e social, na localidade onde ocorra a prestação do serviço.

Porém, insista-se, os aspectos legais acima expendidos dizem respeito somente ao caso específico das empresas de engenharia que prestem serviço no exterior, não se aplicando aos demais casos, os quais, até o presente momento, são regidos pela lei do local onde se dê a atividade laboral.

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